“POEMAS” DE WISLAWA SZYMBORSKA – IMPRESSÕES SOBRE A OBRA

“POEMAS” DE WISLAWA SZYMBORSKA – IMPRESSÕES SOBRE A OBRA

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SZYMBORSKA, Wislawa. Poemas. Seleção, tradução e prefácio de Regina Przybycien. São Paulo: Companhia das Letras, 2017, 165 p.

 

Regina Przybycien, a tradutora desse livro, comenta a dificuldade de verter para o português a produção poética de Wislawa Szymborska (pronuncia-se Vissuáva Chembórska), polonesa ganhadora do Nobel de Literatura em 1996. Acredito. Se toda tradução enfrenta a dificuldade de transportar para outra língua frases carregadas de linguagem regional, por exemplo, ou de ditados populares cujos sentidos são evidentes na língua/cultura de origem, mas cuja tradução literal não faria sentido em outra(o) língua/contexto, a tradução de poesia, especialmente, ainda precisa se preocupar com a sonoridade, com jogos de palavras, imagens e outros recursos poéticos. No caso da produção de Wislawa Szymborska, o caso ainda me parece mais difícil por envolver a combinação de “sofisticação intelectual” e o “tom absolutamente coloquial” de sua obra. Manter-se fiel ao espírito da poetisa polonesa, portanto, deve ter sido mesmo um desafio.

Como se se desculpasse por algum eventual deslize na tradução, Regina Przybycien oferece, ao final do livro, na língua original, os 44 poemas que compõem esta obra. Preocupação desnecessária, acredito, dado o número insignificante de brasileiros que podem se dar ao luxo de ler em polonês. Ainda que alguém se habilite, será coincidência demais que se dê ao trabalho de ler poesia.

(Abro aqui um parêntese para falar de minha inquietação sobre o fato de o brasileiro ler muito pouca poesia. Prova disso é o fato de mesmo as grandes livrarias reservarem seções mínimas dedicadas ao gênero. Sobre este assunto falei aqui).

O trabalho da tradutora, entretanto – ainda que eu não possa avaliá-lo a partir da leitura dos originais – me parece impecável uma vez que consegue aliar a linguagem simples e o conteúdo filosófico profundo que caracterizam a autora.

Embora nos últimos 22 anos, desde a premiação com o Nobel, a poesia de Wislawa Szymborska tenha ganhado o mundo, no Brasil ela é, ainda, praticamente desconhecida, e esse pequeno volume de poemas foi pensado, justamente, como forma de apresentá-la ao leitor brasileiro.

Em mais de 50 anos, Wislawa Szymborska produziu apenas uns 250 poemas, mas essa poética recebeu vários outros prêmios, na Polônia e fora dela.

Nascida no período entreguerras (1923), a autora viveu a experiência da 2ª Guerra Mundial e mais de 40 anos de totalitarismo comunista.  O humor e a ironia utilizados em seus versos são, portanto, formas encontradas de refletir sobre a condição humana e sobre a barbárie.

Seus poemas se nutrem da História, de personagens bíblicos e clássicos e falam, sim, do contexto polonês sob o domínio nazista e depois comunista, mas a forma sutil e indireta com que fazem isso, imprime um caráter de universalidade a esses versos que se abrem ao entendimento dos leitores de diferentes culturas.

Não são poemas difíceis, mas também não são fáceis. Cheios de indagações, colocam o leitor diante de outras formas de ver e de sentir o mundo, tirando-o do conforto de sua visão costumeira e apresentando-lhe o estranhamento diante do novo. Provavelmente lerei o livro uma segunda vez a fim de melhor absorvê-los. Por enquanto, posso afirmar que os versos de que mais gostei dizem respeito à própria poesia, ao ato de escrever:

 

A alegria da escrita.

O poder de preservar.

A vingança da mão mortal.

(“A alegria da escrita – fragmento – p. 36-7)

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Prefiro o ridículo de escrever poemas

ao ridículo de não escrevê-los.

(“Possibilidades” – fragmento – p. 87-8)

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Alguns 

ou seja nem todos.

Nem mesmo a maioria de todos, mas a minoria.

Sem contar a escola onde é obrigatório

e os próprios poetas

seriam talvez uns dois em mil.

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Gostam 

mas também se gosta de canja de galinha,

gosta-se de galanteios e da cor azul,

gosta-se de um xale velho,

gosta-se de fazer o que se tem vontade

gosta-se de afagar um cão.

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De poesia 

mas o que é isso, poesia.

Muita resposta vaga

já foi dada a essa pergunta.

Pois eu não sei e não sei e me agarro a isso

como a uma tábua de salvação.

(“Alguns gostam de poesia” – p. 91)

 

É lamentável, mas são realmente poucos os que gostam de poesia, ainda que ela explique, com beleza, a vida e a nós mesmos. Ainda que entendê-la nos prepare para compreender também o mundo que nos cerca. É lamentável, mas é fato. Quanto a mim, não me lamento, pois amo poesia e ainda que me faltem palavras para descrevê-la, direi com Wislawa Szymborska: “me agarro a isso /como a uma tábua de salvação”.

 

Beijo&Carinho,

 

 

 

Referência:

PRZYBYCIEN, Regina. “Prefácio: A arte de Wislawa Szymborska”. In: SZYMBORSKA, Wislawa. Poemas. São Paulo: Companhia das Letras, 2017, p. 9-24.

Crédito da Imagem da Autora: alliance/dpa

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4 thoughts on ““POEMAS” DE WISLAWA SZYMBORSKA – IMPRESSÕES SOBRE A OBRA”

  • Oi Jussara, talvez as pessoas não gostem, por não conseguirem entender, um país de semi analfabetos, que muitas vezes tem dificuldades em interpretar um texto simples.
    Quando eu leio e consigo compreender eu gosto, mas quando não, fico igual, aquela pessoa que escuta uma piada e não entende.
    E quanto pior for a qualidade do ensino no nosso país, mais gente abandonara a leitura.
    Gostei de “conhecer” Wislava.
    Boa semana, beijos, Vi

    • Concordo com você, Vi. Acho que a grande maioria que afirma não gostar é por não entender. É pena, pois perdem um prazer inexplicável. Beijo&Carinho!

  • a poesia é fruto do trabalho nos campos do Eu e do ego, a reflexão , o julgar se a si mesmo, o conhecer se a si mesmo, ela é fruto da contemplação, da meditação filosófica, do trabalho com a psique e da inteligência como um todo, e isso é raro…e é preciso ser raro para cultivar o raro, Gostei de conhecer WISLAWA.

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