AMIGAS, UM CHALÉ, UM QUINTAL E GIL VICENTE

AMIGAS, UM CHALÉ, UM QUINTAL E GIL VICENTE
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Ontem à tarde saí com duas amigas. Fomos até o chalé que uma delas está construindo nos Caixetas, um bairro de zona rural, mas muito pertinho da cidade. Se no futuro a Stela quiser morar lá ao invés de utilizar o chalé somente aos finais de semana, será totalmente viável – o ar do lugar é outro pela presença do riacho, do bambual, do verde todo que cerca o chalé – mas a cidade está pertinho. A Cláudia é a outra amiga; mora em Poços de Caldas. Um encontro desse trio é coisa rara, mas sempre é especial. Na faculdade montamos um grupo de teatro e nos apresentamos com sucesso numa noite cultural. A peça? Uma adaptação de “Todo-o-Mundo e Ninguém”, de Gil Vicente. A Cláudia fazia o papel de “Belzebu”, um demônio mandado por Lúcifer (o principal dos demônios) à terra a fim de espreitar os humanos; Stella fazia o “Dinato”, um demoniozinho escrivão, todo atrapalhado. As exigências de “Belzebu” e as lerdezas de “Dinato” foram responsáveis pela maior parte das gargalhadas durante a apresentação. Eu fazia o papel de um homem rico, materialista e desonesto, chamado “Todo-o-Mundo”, outra colega fazia “Ninguém”, um homem humilde e virtuoso.
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Um fragmento:
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Ninguém:  Que andas tu aí buscando?
Todo-o-Mundo: Mil cousas ando a buscar:/ delas não posso achar,/
porém ando porfiando/por quão bom é porfiar.
Ninguém:  Como hás nome, cavaleiro?
Todo-o-Mundo: Eu hei nome Todo-o-Mundo/  e meu tempo todo inteiro/
sempre é buscar dinheiro/ e sempre nisto me fundo.
Ninguém: Eu hei nome Ninguém,/ e busco a consciência.
Belzebu: Esta é boa experiência:/ Dinato, escreve isto bem.
Dinato:  Que escreverei, companheiro?
Belzebu: Que ninguém busca consciência/  e todo o mundo dinheiro.
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Todo-o-Mundo: Folgo muito d’enganar,/ e mentir nasceu comigo.
Ninguém:  Eu sempre verdade digo/ sem nunca me desviar.
Belzebu:  Ora escreve lá, compadre,/ não sejas tu preguiçoso.
Dinato:  Quê?
Belzebu: Que todo o mundo é mentiroso,/  E ninguém diz a verdade.
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(Gil Vicente, “Todo-o-Mundo e Ninguém”, parte de O auto da Lusitânia)

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Embora Belzebu se refira aquilo que na peça as personagens efetivamente são e fazem, elas são alegorias daquilo que na realidade a maioria (todo mundo) é (ou faz) e do que, infelizmente, quase ninguém é (ou faz).  Na fala de “Belzebu”, portanto, é que se processa toda a sátira de Gil Vicente à sociedade de sua época (final da Idade Média) e a de qualquer tempo.

Pelo pequeno trecho transcrito acima dá para imaginar o sucesso que fizemos na apresentação adaptada da peça. Como disse, não é sempre que o trio – Cláudia, Stela e Jussara – se encontra, mas quando acontece é sempre especial. Na volta para casa a Cláudia falava de umas bolachinhas de Natal que comera em minha casa no dia 24; Stella ficou com vontade. Convidei-as para um café. Pelo celular pedi à minha mãe que fizesse o café (não gosto do meu e o dela é delicioso). Viemos para casa e tomamos café com as bolachinhas de chocolate e canela. Depois sentamos no meu quintal e as duas elogiaram a cortininha que tenho sob o tanque, o que me animou a mostrá-la aqui: 
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Para variar, pintura da minha mãe
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Em cima do tanque, quadrinho bordado pela minha filha:
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(Eu não sou mesmo muito paparicada por mãe e filha?)
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Beijo&Carinho,
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Crédito da imagem em destaque, aqui.
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14 thoughts on “AMIGAS, UM CHALÉ, UM QUINTAL E GIL VICENTE”

  • Oi Jussara!

    Seja super bem vinda no meu cafofo! Amo Minas! Morei em BH nos anos 80… Tenho muitas boas lembranças…

    Lendo o texto da peça, fiquei a pensar que sentimentos bons ou maus, são atemporais e eternos! Que nem a boa amizade de vcs…

    Pelo jeito o DNA de artista está em toda família, os dois trabalhos muitos lúdicos e doce! Amei!

    Gostei do seu espaço, já estou linkando…

    Um ano novo cheio de pequenas e grandes realizações p/ vc e família!

    Beijossssssss

  • Realmente, Minas é tudo de bom!

    (He, saudades de Machado, meu Deus!! Sou paulista, mas, filha de mineira. Faz um ano que fui aí, mas, parece que faz um século, pois, a saudade é forte de mais!)

    Jussara, beijos e uma ótima semana para você!

  • Bia, ao postar, pela manhã, estava pensando justamente que os valores atemporais do texto de Gil Vicente residem no fato de ele enfocar o homem… e de as questões humanas serem sempre as mesmas, passe o tempo que for. Vc percebeu isso! Agradeço a visita e o elogio ao DNA artístico da família… elas são mais artistas que eu… eu fico quase só a burilar palavras… Obrigada pelos bons votos. Sucesso para vc tb em 2012! Abraço!

  • Ai Ju… primeiro a delicia do passeio.. fiquei aqui imaginando o chalezinho… ai, ai, ar puro em Sampa é ouro, srrs
    Depois fiquei imaginando a peça, e o melhor a amizade que continua… e o café com bolachinhas.
    eu sou fissurada em café, e Vi faz o melhor que eu já tomei. (O meu é horrível, srrsrs) Ela até pega no meu pé para não tomar muito, senão não durmo á noite,rsrsr

    E para terminar, que fofura a cortininha e o quadrinho ?
    Ah, um dengo só, acho tão legal a gente voltar ao handmade… esses detalhes fazem um lar !!!

    Bjus 1000 e já falei que adoro esse cantinho ??
    Não ? Então, adoro, srsrs

    !!

  • Oi, Pepa, vc foi a segunda pessoa a comentar a amizade que continua… bonito isso, né?
    Humm… o café da Vi deve ser como o da minha mãe. Pior é que li em algum lugar que uma xícara de café com açúcar equivale a um docinho… e ando viciada em café! O que fazer com a balança? rs
    Abraço na Vi, outro em vc! Adoro vcs!

  • Amei o post, pra variar.
    Uniu várias coisas que eu gosto!
    Literatura, amizade, comida, artes.. tudibão, né?
    Você é mara, mãezinha.. sou sua fã!
    Só pra constar…
    TODO MUNDO ama seus biscoitos, NINGUÉM consegue parar de comer!! rs 🙂

  • Olá!
    Vim te deixar um beijo antes que o ano acabe e eu viaje.
    Obrigada pelo seu carinho e companhia.
    Amizades são preciosas e a gente deve prezá-las sempre (tanto aqui no mundo virtual, e mais ainda no mundo real.
    E nos dois , as vezes é muito difícil reuni-las…
    O passeio, depois o café deve ter sido tudo de bom mesmo pelo seu relato.
    Amei a cortininha que sua mãe pintou. Um charme !!!
    O quadrinho bordado pela sua filha também confere um charme todo especial ao cantinho.
    Já que a gente precisa fazer esses afazeres domésticos (chatos), nada como fazer num cantinho charmosos para tornar a lavagem de roupas mais agradável, não é mesmo?rs
    Um bom principio de ano para vc e todos os seus, que todos os seus sonhos planejados se realizem.
    Um beijo

  • Fabiana,
    obrigada pela atenção em vir se dspedir de mim. Já lhe desejei boa viagem e um ano cheio de coisas boas, mas reforço tudo isso. Em menos de dois meses me acostumei a ter as suas sugestões e companhia; sentirei sua falta!
    Obrigada pelo comentário tão gentil e carinhoso.
    Abraço!

  • Oi, Sidnei,
    é um auto, sim, pois tem conteúdo religioso. O fragmaneto "Todo-o-mundo e Ninguém" ganhou autonomia, mas pertence originalmente ao "Auto da Lusitânia". Os demônios estão a espreitar os humanos a mando de Lúcifer, pois este quer saber como andam seus domínios cá na Terra. Gil é fabuloso. Uma percepção das características humanas… que só ele! Concordo: falta-nos um Gil Vicente! Abraço!

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